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quinta-feira, 29 de dezembro de 2011


Submundo

Li, na minha longínqua infância, uma história em quadrinhos cujo enredo muito me impressionou. Tratava-se da história de um mundo subterrâneo que repetia, para meu espanto, o próprio mundo sobreterrâneo, numa espécie de platonismo invertido.
            Referia-se a um mundo por baixo da terra onde habitavam seres estranhos, constituintes de uma civilização esquecida, porém devotada à preservação de incorruptíveis valores. O mundo subterrâneo era composto de homens e mulheres devotados à poesia, à música, às artes, embora mantivesse um exército de excepcionais guerreiros cuja missão era a defesa da integridade e do segredo dos subterráqueos.
            A cidade debaixo da terra era formada de intermináveis labirintos e imensos salões onde sábios anciões reuniam-se para orientar o destino dos povos da superfície. A missão precípua dos subterráqueos era manter a humanidade longe de seu fim por meio das lições de sabedoria, da ética e da salvação.
            A humanidade visível dependia desta luta secreta entre a devota missão dos sub e a distraída resistência dos sobre.
            Embaixo, atravessando infinitos corredores, ora gotejantes e sombrios, ora claros e imaculados, os habitantes trabalhavam, educando e depurando a refinada população composta de milhares de seres humanos trajados de branco.
            Sempre que necessário, um dos subterráqueos subia à superfície para, como num sonho, orientar e interferir na vida dos humanos no mundo superior.
            Então, os conflitos, as misérias humanas e, principalmente, o princípio da preservação da nossa espécie deviam-se a estas oníricas intermitências. O mundo oculto, preservado nos subterrâneos, era responsável pela solitária grandeza do homem. Sua humanidade, desde sempre, era o resultado de uma luta secreta, de devoção a uma outra humanidade; essa, oculta sob os escombros da Terra.
            Enfim, encontrava-se nova razão para os sonhos: revelar o homem a si mesmo a partir de um franco sentimento de amor ao próximo.
            Apesar de um mundo tectônico, secreto, não revelado, era ele o responsável final por uma nova humanidade.
            Em meus delírios infantis (tinha talvez meus oito anos),  a aurora de minha vida, de que tenho saudades, era esta humanidade do submundo que existia, para tornar a vida possível.
            Neste mundo, eu era protagonista. Vestido de branco, com as mãos brancas, caminhando por nuvens brancas, eu trazia a mensagem branca da salvação...
            Depois, não sei mais que fim levou esta humanidade secreta, mas, de vez em quando, eu ainda acho que vivo enterrado na imensa claridade de luz mediterrânea de todas aquelas virtudes.
            Viver, muitas vezes vale a pena, porque a esperança habita o surpreendente ventre da terra. Mas quem se importa?

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Impossível Natal

         Não quero escrever sobre quem é o natal. Disso já sabemos.

         Sabemos que é a comemoração do nascimento de um homem-deus, irrepetível. Como também sabemos que este caráter único nos fascina e nos embaraça, porque, se bem compreendida a criança nascida há 2011 anos, somente iguala-se a nós na dor, no sofrimento, físico e moral.

         Somos muito parecidos com ela, mas só quando somos menos homens.

         Pode ser que esteja na hora de se pensar sobre o que é o natal.

         O natal é um estilo de vida, uma páscoa moral, onde cada um de nós aceita ser a fonte milagrosa de onde jorra a água da vida, aceitando ser o outro do outro, cuja dádiva plena é a tolerância, isto é: suportamos do outro aquilo que não toleramos em nós mesmos.

         Natal é a lição mais profunda de humildade: o perdão. Mas não é a anistia compulsória dos males alheios, porém o braço amigo que ajuda a suportar o peso corporal dos erros cometidos e do arrependimento.

         O estilo de vida chamado natal não supõe o acúmulo de conforto e riqueza às custas da devastação. Refiro-me à natureza predatória do enriquecimento ilícito, fruto da malandragem, da esperteza e da má-consciência: da devastação das esperanças e dos afetos e do calor humano, deste ágape infinito com que nos reconciliamos com nossos irmãos necessitados de tudo.

         O impossível natal não se recolhe das ilusões perdidas, mas da infinita tristeza por não termos sido capazes de reconhecer o Menino-deus que habita em todos nós.

         É que o impossível natal é obra do despojamento, da recusa amável e compreensiva em apostar todas as fichas no poder de acumular, de se supor visível para Deus a partir dos bens obtidos na corrupção, no roubo, na esperteza, nas traições.

         O impossível natal se aninha em nosso espírito quando finalmente compreendemos a natureza doadora da maturidade. É quando descobrimos que somos verdadeiros quando o natal nos traz de volta o que perdemos na indiferença pelos destinos humanos, dos humilhados e ofendidos.

         Nenhum homem consegue pular sua própria sombra, mas nem por isso deixamos de tentar: como não deixamos de tentar fazer, da manhã seguinte, o início de todas as manhãs, já que o sol é sempre novo para quem crê.

         O impossível natal se torna possível quando descobrimos que Jesus é o nome daquilo que nascemos para ser, profundamente, verdadeiramente, quando merecermos. E quando tivermos coragem de Ser.

                                                                  FELIZ NATAL

terça-feira, 6 de dezembro de 2011




DESPEDIDA

Puseram os antigos o tempo numa ampulheta e disseram que era areia.
E lá ficou a areia desfiando-se em infinitas estrias, dentro do vidro.
Puseram os antigos a areia numa ampulheta e disseram que era tempo.
E á ficou o tempo a destruir a inocência das coisas.
Um dia, rompida a ampulheta
Os homens disseram que o tempo escoava, como fina areia
Por nossos dedos.

Então, um deles, que nunca deixou de ser menino,
Suspeitou impossível deter o tempo.
Decidiu inventar a memória, sutil musa inconsútil,
Vivendo da coragem de viver a plenitude do instante.

Foi assim que o Tempo virou memória.
E o menino encantado abriu o peito em luz
E predicou: enquanto eu não foi homem serei imortal.

Talvez por isso
Somente as crianças são imortais,
Porque acreditam que a imortalidade
É olhar para as coisas como se fosse a primeira vez
E que todas as cores do mundo não valem a sombra de um instante.

Contudo, há de chegar a hora de cuidar das flores.
Depois, acolher os frutos na concha vazia das mãos.
É sempre tempo de reinventar
o milagre das sementes.

segunda-feira, 28 de novembro de 2011


ESCOLHAS


            O homem é um animal que escolhe, esta é sua agonia e sua grandeza.
            Toda escolha se dá no estreito universo do binarismo: quando escolhemos um caminho é para, mais adiante, escolhermos outro, de novo e de novo, aos pares. Talvez por isso, as escolhas são duplos angustiantes.
            Escolheremos sempre até a agonia cessar, mas isto só é possível com a morte. Aliás, dizem que nem nesse caso deixaremos de escolher. O purgatório, quando existia, era apenas uma pausa para as escolhas entre o céu e o inferno.
            O futuro é sempre uma aposta, porque sabemos que, em algum momento, teremos de decidir por um caminho, sempre com a nostalgia dos caminhos que não escolhemos.
            Podemos, é claro, fazer como aquela personagem de Machado de Assis, no romance Esaú e Jacó, a Flora, podemos escolher não escolher, mas esta opção é suicida. Ninguém pode viver sem escolher. A recusa é solipsista e insuportável.
            Mas não é preciso desesperar. Sempre se pode escolher a partir de convicções pessoais e honestas. A partir de verdades íntimas que nos completam e nos tranquilizam, desde que sejam escolhas válidas, humanas, fraternas e, sobretudo, sinceras. De todo modo, assim que decidimos o caminho, devemos sempre nos preparar para a solidão.
            Afinal de contas, esta inquietação das escolhas é a diferença entre o homem e o orangotango. Oragotangos não têm dúvidas, não se arrependem, vivem mergulhados em certezas absolutas. Enfim, não são homens, embora com eles se pareçam.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011




HORAS MORTAS


            Surpreendi-me, numa incerta madrugada, a cogitar sobre este mania absolutamente improdutiva de viver com o pensamento. Parece uma obstinação inútil esta forma de apartar-me do mundo. Pois quando mergulhamos no pensamento acordamos um ego diferente daquele que habita nossos dias. Falo do ego-pensante.
            O pensamento é uma “coisa” além dos nossos sentidos, até mesmo do sexto de nossos sentidos que é o senso comum. O pensamento-coisa vai se desenrolando em frases sutis, aparentemente desconexas, mas que, de repente, formam algum sentido, quase sempre repetidos de algum pensador ilustre que pensou antes de nós. Mas o prazer de se saber próximo dos grandes filósofos, como uma ressonância de leituras passadas, ainda assim é um imenso prazer. Boa parte de nossa cultura é feita de esquecimento.
            A verdade é que pensamos pouco, pouco e mal, sobretudo no Brasil. Temos uma espécie de inapetência para as especulações, principalmente as filosóficas. Não basta a presença da morte ou o mistério da natureza, do mundo. Sabemos que ele existe antes e depois de nós, resiste ao tempo, e resistirá sempre, até que deixe de existir, coisa que jamais seremos capazes de ver ou de saber.
            Falei de prazer: quero dizer prazer intelectual. Esse prazer solitário que não se pode comparar com uma sexualidade oprimida ou perversa, mas com uma espécie de fruição incomunicável. Quem pensa como um pensador está condenado ao silêncio, à solidão, ao solipsismo. Algumas vezes, à loucura, como Nietzsche.
            Confesso que tentei, inúmeras vezes, deixar de pensar e dedicar-me à vida ativa, a vida da competição feroz pelo vil metal, mas logo passa. As vezes em que ela resultou de alguma empreitada empresarial, conheci o desastre da falência. Desisti.
            Hoje que minha velhice progride rumo à terra ignota, ao Desconhecido, prefiro continuar pensando as coisas que meus livros me ensinam, na mais feliz e produtiva solidão, incomunicável como uma ostra, exceto nestas colunas que a amizade delicada que minha querida amiga Flora me dedica, como uma dessas humildes delicadezas que a vida nos preparada.
            Também aprendi, na dureza do cotidiano, que ninguém escapa ao naufrágio das ilusões, nem você, gentil leitor, nem eu.

sábado, 12 de novembro de 2011





GLOSSÁRIO
DA
SABEDORIA E DO SENSO COMUM
SEGUNDO O JAGUNÇO RIOBALDO
TATARANA DISSERTOU EM 3 DIAS
E 3 NOITES PARA SEU OUVINTE
MISTERIOSO.

 DO AMOR
            MAS ciúme é mais custoso de se sopitar do que o amor. Coração da gente – e escuro, escuros
            O amor? Pássaro que põe ovos de ferro.
            Amizade dada é amor.
            Ah! A flor do amor tem muitos nomes.
            Ah! Meu senhor! – como se o obedecer do amor não fosse sempre ao contrário.
            Só se pode viver perto do outro, e conhecer outra pessoa, sem perigo de ódio, se a gente tem amor. Qualquer amor já é um pouquinho de saúde, um descanso na loucura.
O amor só mente para dizer maior verdade.

            DA CONFIANÇA
            Confiança – o senhor sabe – não se tira das coisas feitas ou perfeitas: ela rodeia é o quente da pessoa.
            Acho que sempre desgostei de criaturas que com pouco e fácil se contentam.

            DO CONSELHO
            Ah! Conselho de amigo só merece por ser leve, feito aragem de tardinha palmeando em lume-dágua

            DA CONVIVÊNCIA
            A gente nunca deve de declarar que aceita inteiro o alheio – essa é a regra do rei!
A colheita é comum, mas o capinar é sozinho.
            Um sentir é do sentente, mas o outro é do sentidor.

            DO JAGUNÇO E DO HOMEM
            Riobaldo, homem, eu, sem pai, sem mãe, sem apego nenhum, sem pertencências.
            O jagunço Riobaldo. Fui eu. Fui e não fui. Não fui – porque não sou, não quero ser. Deus esteja.
            Sempre fui assim, descabido, desamarrado.
            Um homem, coisa fraca em si, macia mesmo, aos pulos de vida e morte, no meio das duras pedras.

            DEUS
            Com Deus existindo, tudo dá esperança: sempre um milagre é possível, o mundo se resolve.
            Deus existe mesmo quando não há.
            Tudo tem seus mistérios.
            Deus é uma plantação
            Moço! Deus é paciência. O contrário é o diabo.
            Senhor sabe: Deus é definitivamente; o demo é o contrário dele.

            DA DOR
            A dor não pode mais do que a surpresa.

            DA VIDA E DA EXISTÊNCIA.
            Viver é negócio muito perigoso.
            Passarinho que se debruça – o vôo já está pronto.
            Tudo sobrevém.
            Viver é um descuido prosseguido
            O mal ou o bem, estão é em quem faz; não no efeito que dão.
            O que induz a gente para más ações estranhas, é que a gente está pertinho do que é nosso, por direito, e não sabe, não sabe, não sabe.
            Deveras se vê que o viver da gente não é tão cerzidinho assim?
            O que demasia na gente é a força feia do sofrimento, própria, não é a qualidade do sofrente.
            Comigo, as coisas não têm hoje e ant’ontem, amanhã é sempre.
            Esta vida é de cabeça – para-baixo, ninguém pode medir suas perdas e colheitas.
            Pensar mal é fácil, porque esta vida é embrejada. A gente vive, eu acho, é mesmo para se desiludir e desmisturar.
            A gente – o que vida é – é para se envergonhar.
            Cansaço faz tristeza, em quem dela carece.
            O bom da vida é para o cavalo, que vê capim e come.
            Tudo o que já foi, é o começo do que vai vir, toda hora a gente está num compito.
            Todo caminho da gente é resvaloso.
            O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente e coragem.
            No estado de viver, as coisas vão enriquecidas com muita astúcia: um dia é todo esperança, o seguinte para a desconsolação.
            Ah, as coisas influentes da vida chegam assim sorrateiras, ladroalmente.
            A vida é mutirão de todos.
            Um lugar conhece outro é por calúnias e falsos levantados, as pessoas também, nesta vida.
            A vida é um vago variado.
            A vida é muito discordada. Tem partes, tem artes. Tem as neblinas de Siruiz. Tem caras todas do Cão, e as vertentes do viver.
            Picapau voa é duvidando do ar.
            Sossego traz desejos.
            Porque aprender-a-viver é que é o viver, mesmo.

            DA FELICIDADE
            Perto de muita água, tudo é feliz.

            DO HUMANO
            Homem? É coisa que treme.
            Jagunço não passa de ser homem muito provisório.
            Natureza da gente não cabe em nenhuma certeza.
            Ser forte é parar quieto; permanecer.
            Existe é homem humano. Travessia.

            DA LEALDADE
            Cavalo que ama o dono, até respira do mesmo jeito.

            DA MOCIDADE
            Mas mocidade é tarefa para mais tarde se desmentir.

            DO ÓDIO, DO AMOR
            O ódio – é a gente se lembrar do que não deve-de; amor é a gente querendo achar o que é da gente.

            DO PARENTESCO
            Parente não é o escolhido – é o demarcado.
           
            DA POBREZA
            Pobre tem de ter um triste amor à honestidade.

            DO PODER
            De homem que não possui nenhum poder nenhum, dinheiro nenhum, o senhor tenha todo medo.
            A primeira coisa, que um para ser alto nesta vida tem de aprender, é topar firme as invejas dos outros restantes...
            Que comandar é só assim: ficar quieto e ter mais coragem.
            Um chefe carece de saber é aquilo que ele não pergunta.

            DO REAL
            Digo: o real não está na saída nem na chegada: ele se dispõe para a gente é no meio da travessia.
            Do que o que: o real roda e põe adiante.

            DO RISO
            Rir, antes da hora, engasga.

            DO SABER
            Sujeito muito lógico, o senhor sabe: cega qualquer nó.
            Quem desconfia, fica sábio.
            Pessoa limpa, pensa limpo. Eu acho.
            Mestre não é quem sempre ensina, mas quem – de repente – aprende.
            A gente só sabe bem aquilo que não entende.
            Esquecer, para mim, é quase igual a perder dinheiro.

            DO SERTÃO
            Sertão é onde o pensamento da gente se forma mais forte do que o poder do lugar. Viver é muito perigoso.
            Sertão é onde o homem tem de ter a dura nuca e mão quadrada.
            Sertão é o sozinho
            Sertão é dentro da gente.
            Sertão é isto: o senhor empurra para trás, mas de repente ele volta a rodear o senhor dos lados. Sertão é quando menos se espera; digo.
            Mas o sertão era para, aos poucos e poucos, se ir obedecendo a ele; não era para à força se compor.
            O sertão é uma espera enorme.

            DA SAUDADE
            Moço: toda saudade é uma espécie de velhice.

            DO SILÊNCIO
            Ficar calado é que é falar nos mortos.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011


TIRÉSIAS


            Na ex-União Soviética, sob Brejnev, havia uma jovem professora universitária, especialista em literatura inglesa do período romântico.
            Esta jovem professora russa foi presa. Como sempre, nas ditaduras, foi presa sem processo, sem razão, apenas porque foi delatada por um serviçal de plantão. Ela sabia de cor os 30 mil versos do Don Juan de Byron.
            A cela que lhe coube era completamente escura, então, no meio daquela noite artificial, ela traduziu, mentalmente, para o russo, todo o poema.
            Tendo saído da prisão e ficado cega, pediu que uma amiga anotasse a tradução.
            É desse modo que o povo russo pode ler o grande texto de Byron.

A URGÊNCIA DAS COISAS

            Vou retomar uma anedota maravilhosa envolvendo o grande filósofo alemão, Hegel, segundo a narração de George Steiner.
Não se pode afirmar que fosse Hegel amigo dos judeus.Segundo o filósofo,o Todo-Poderoso apareceu e propôs a um judeu : “Eu te ofereço uma escolha; ou escolhes a salvação eterna ou o jornal da manhã.” E o judeu escolheu o jornal matutino.

ELEIÇÃO MUNICIPAL

Cabo Frio, pedaço do Paraíso
Por onde cruza errante
A sombra de Caim.

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

PREZADO PÔNCIOS


Pilatos, intruso no credo
lavou as mãos de suas desculpas.

A história passou por ele
sem deixar traços nem culpas.

Talvez Pilatos soubesse
em sua imperial intimidade
que não valia a pena,
a pena de ignorar o Império:
ignorou um homem.

Pilatos ganhou a imortalidade
lavando as mãos com a singeleza
de quem prepara o corpo
para mais uma noite se insônia.

Mal sabia o romano
que escrevia no sono
o mais atroz pesadelo,
que ainda assombra
as noites de quem apenas lavou
                                     as mãos.

Mas não lavou a infâmia. 

sexta-feira, 21 de outubro de 2011


MUSAS ADJETIVAS
Anda aqui dentro
calado e fundo
um amor vagabundo.

Anda ou rasteja
não sei ao certo.
Se erra ou anda
é coisa incerta
porque são tortas as veredas...
(e não valem as vidas
estraçalhadas nos rastros
que deixam os amantes.)

Amantes que como dantes
procuram vagas beatrizes
imponderáveis helenas
improváveis penélopes...

É nos livros que elas vivem
adjetivas sem pudor,
jamais substantivas.

Todas estas mulheres existiam
de nunca chegar a serem
                   serenas sereias.