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terça-feira, 7 de junho de 2011

A MENINA E O ANJO

 
            -- Pai, você me traz um anjo?
            Assim do nada, como fazem quase todas as crianças, a menina dirigiu-se ao pai à mesa do jantar. A mãe surpreendeu-se com o pedido e o irmão mal disfarçou a cumplicidade do riso moleque: “o que Maria Luiza estava aprontando agora?”. O pai suspendeu a trajetória do garfo a meio caminho da boca, sem entender exatamente a natureza do pedido.
            -- Você quer o quê?
            -- Eu quero que você me traga um anjo.
            A família, reunida para o jantar especial, porque o pai iria viajar na manhã do dia seguinte e demoraria uns três meses fora, tratou o pedido com a desenvoltura de costume já que Maria Luiza (era o nome da menina) do alto da autoridade de seus cinco anos e meio, filha caçula, era mestra em estranhos pedidos. Uma vez, passou semanas implorando que o pai lhe trouxesse um pedaço de nuvem, mas nunca houvera proposto um anjo.
            --Mas por que um anjo, meu bem?
            -- Ora, eu não sei, mas eu queria ter um anjo.
            A mãe, acolhendo delicadamente a mão da menina nas suas, sorrindo como só as mães sabem e cometendo o mesmo afeto como só as mães cometem, disse-lhe que era um presente difícil de obter. Disse-o com ternura. O pai, talvez percebendo que, no fundo, o presente impossível traduzisse a cifra da saudade e da ausência, prometeu cumprir o desejo. A mãe ainda tentou negociar o anjo por uma boneca “que se vende naquela loja grande de Nova Iorque” para onde ia o pai, mas o esforço foi inútil. Maria Luiza, sob o olhar maroto do irmãozinho mais velho, insistia no anjo.

            Três meses depois, o pai voltou da viagem e, já no aeroporto, entre beijos e lágrimas, e muitos afagos adiados, Maria Luiza indagou ansiosa:
            -- Você trouxe meu anjo?
            -- Trouxe, filhinha, está na mala. Em casa agente vê!
            No meio da sala, com todos os pacotes abertos e muitos presentes espalhados pelo chão, é que o pai exibiu um admirável anjo de cristal, com pequenas lâmpadas iluminando as asas que se abriam e fechavam ao som de suave melodia. A menina arregalou os olhos. Contida a respiração, tomou o anjo delicadamente em suas mãos pequenas e frágeis e abraçou o pai com infinita ternura. Depois, pediu-lhe:
            -- Pai, você me ensina a ver este anjo?

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